Facchini

Exame toxicológico para renovar a CNH tira o sono de motoristas de caminhões e ônibus

A partir deste mês, todos os motoristas das categorias C, D e E terão de fazer o exame toxicológico do fio de cabelo, que detecta o uso de drogas ilícitas, para renovar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), em cumprimento à lei federal 13.103 e à deliberação 145 do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). A determinação está provocando a revolta dos condutores, que apontam o alto custo do teste e argumentam que a medida é discriminatória. Do outro lado, laboratórios de análises clínicas se preparam para a grande demanda que vai surgir.
A obrigatoriedade também vale para quem vai tirar a carteira, mudar de categoria ou adicionar uma categoria. Serão afetados os segmentos do transporte de carga, como os caminhoneiros, e também o transporte de passageiros, como os condutores de ônibus. Em todo o Estado, 1.265.250 motoristas estão registrados nas categorias sujeitas aos exames. O Departamento de Trânsito do Paraná (Detran-PR) não interfere nem intermedia o teste. O próprio motorista deve procurar um laboratório. Em Curitiba, a Tribuna apurou que o exame custa de R$ 300 a R$ 550.

Discriminação
Para o caminhoneiro autônomo Metódio Repzuk, no ramo há 40 anos, a deliberação é injusta porque atinge apenas os motoristas profissionais. “Eles querem obrigar, tudo bem, então por que não é de graça e não obriga todo mundo? Tem os caminhoneiros ‘malas’ que usam drogas, a gente vê, mas também tem os filhinhos de papai que usam”, argumenta.
Além do caráter discriminatório, o presidente da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA), Diumar Bueno, acusa a ineficácia da medida. “O que vale é a fiscalização na hora, na estrada. Sem fiscalização feita pelas polícias nas rodovias, não é isso que vai contribuir pra uma maior segurança”, diz. O exame aponta o uso de drogas nos 90 dias anteriores à coleta do fio de cabelo. Depois de ter feito o teste, o motorista poderia consumir as substâncias e pegar o volante, no raciocínio do presidente.
Falta incentivo à reabilitação
Outra questão discutível, segundo o presidente da CNTA, Diumar Bueno, é que o estado irá impedir a renovação da carteira do motorista que usa drogas, cortando sua fonte de renda, mas sem oferecer tratamento de saúde. “Qual encaminhamento o governo vai dar para o dependente de drogas? Só vai cancelar seu direito de trabalhar, sem reabilitá-lo?”, questiona. Para Diumar, a deliberação parece atender mais a interesses de grupos de laboratórios do que garantir segurança nas estradas.
A CNTA, que tem mais de 100 sindicatos de motoristas autônomos filiados, vai entrar com medidas judiciais contra a determinação. A Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários do Estado do Paraná (Fetropar) afirmou, através de nota, que “a obrigatoriedade do exame toxicológico para os motoristas profissionais não pode ter caráter apenas punitivo, mas deve estar ligada diretamente a uma política de saúde que seja capaz de promover o acompanhamento, o tratamento e a recuperação dos trabalhadores cujo exame tiver resultado positivo”.

Índices
De acordo com pesquisa feita em 2012 com 670 caminhoneiros no pátio de triagem do Porto de Paranaguá, 50,7% disseram ter usado substâncias psicoativas durante a profissão e 10,9% admitiram que o uso foi recente (nos últimos 30 dias). Os dados integram a tese de doutorado em Saúde Coletiva de Edmarlon Girotto, na Universidade Estadual de Londrina (UEL) em 2014.

Por que o exame é tão caro?
A complexidade técnica e a dificuldade logística são responsáveis pelo alto custo do teste. Somente seis laboratórios brasileiros foram credenciados para fazer o exame. Três realizam a análise no Brasil e outros três mandam o material para Inglaterra ou Estados Unidos, de acordo com a biomédica especializada em toxicologia Lucelaine Gonçalves Morales, do Laboratório Sodré, no interior de São Paulo.
“Cada um desses seis laboratórios tem sua rede com centenas de laboratórios credenciados, que apenas realizam a coleta do material pelas cidades do país”, explica. O fio de cabelo ou pelo corporal viaja por companhias aéreas, pelos Correios ou por transportadora, o que encarece o valor, conforme a biomédica.
Cada centímetro de fio, a partir do couro cabeludo, revela as substâncias (maconha, cocaína, crack, anfetaminas e metanfetaminas) usadas nos 30 dias anteriores. Assim, para a janela de detecção de 90 dias exigida pelo Denatran, é necessário que o cabelo tenha no mínimo três centímetros de comprimento. A análise envolve uma etapa manual, em que o fio é cortado e higienizado, e também requer equipamentos sensíveis, que são importados e exigem mão de obra especializada.

300 mil testes mensais
Segundo a biomédica Lucelaine Gonçalves Morales, do Laboratório Sodré, a precisão do exame é incontestável. “As substâncias utilizadas ficam impregnadas na queratina. A matriz do corpo que mais concentra essa proteína é o cabelo. Não adianta argumentar que foi fumaça de maconha ou pó de cocaína que contaminou o fio externamente, porque o material é limpo e a análise é profunda”, afirma.
Volume alto
A deliberação do Denatran vai gerar uma demanda pelo exame toxicológico maior que a atual demanda mundial, diz. “Calculamos, através do número de carteiras e da frequência de renovação necessária, que serão feitos 300 mil testes ao mês, em todo o Brasil”.

Contra a medida
Os Detrans de São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Pernambuco e Tocantins entraram na Justiça contra a obrigatoriedade do exame toxicológico e tiveram ganho de causa. A argumentação é de que nenhum país no mundo exige o teste como ação de saúde pública. Em outros quatro estados, Pernambuco, Paraíba, Alagoas e Mato Grosso do Sul, os Detrans também pediram a suspensão da medida. 
FONTE: Paraná Online 
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