A falta de motoristas de caminhão qualificados que atendam o perfil exigido hoje pelo mercado é uma das preocupações, em geral dos setores diretamente ligados ao transporte rodoviário de cargas. As mais visíveis partem dos próprios transportadores, os quais apontam um déficit de cerca de 90 mil motoristas sem capacitação, embora estes números não sejam oficiais. Os autônomos, principalmente, estão bastante conscientes da importância da atualização e reciclagem, porém convivem com a falta de tempo, pois vivem a realidade de uma rotina de trabalho que não o permite se ausentar da estrada, sob a pena de perda de faturamento, o que significa um grande problema para a maioria, que já convive com o orçamento no limite.
O autônomo Valtair Flores, 44 anos de idade, que transporta cargas diversas para o Uruguai, e retorna para São Paulo com pescado, reconhece que os cursos de especialização e de atualização se tornaram imprescindíveis para o profissional que quer crescer e conseguir bons fretes. Diz que seu único problema é encontrar um tempo para encostar o caminhão, principalmente no seu caso, que depende exclusivamente do frete. "Mas, para quem trabalha como empregado é um pouco mais simples, porque geralmente é a própria empresa que solicita o treinamento e dispensa o funcionário", acrescenta.
Admite que faz um bom tempo que não participa de um curso direcionado à profissão. Para se ter uma ideia, está com o curso de Movimentação de Cargas Perigosas vencido. Sua sorte, reconhece, é que a empresa para a qual presta serviço com frequência confia no seu trabalho e não exige atualizações, principalmente porque Valtair não transporta produtos perigosos. "Mas sei que se um dia surgir a oportunidade de transportar esse tipo de carga vou perder o frete", reconhece.
Diz que já se informou sobre as unidades do Sest Senat disponíveis para renovar o MOOP, porém, não sabe quando poderá fazer, principalmente porque alguns colegas que concluíram cursos profissionalizantes lhe disseram que precisaram de muitos dias. "Claro que lá na frente o esforço será recompensado, mas é complicado. O ideal seria se as empresas que ministram as aulas conseguissem concluí-las em poucos dias", opina.
Enquanto não encontra tempo, procura se atualizar como pode através de matérias publicadas em revistas especializadas, que diz ler com frequência, principalmente matérias que tratam sobre as novas tecnologias e direção segura. Outra maneira encontrada por ele foi equipar o caminhão com rastreador e aprender a utilizá-lo para atender uma das principais exigências das transportadoras. Mas, conforme diz, tudo isso não tira a importância dos cursos, que ajudam até a reduzir os acidentes. "Quando fiz o de direção defensiva aprendi uma série de coisas a respeito de segurança viária. Se todos os motoristas o fizessem, o Brasil teria muito mais condutores conscientes de seu papel na estrada", conclui.
Apesar de fazer parte da nova geração de carreteiros, Adriano Di Iedrich, 30 anos de idade e oito de estrada, confessa que ainda não se preocupou em fazer cursos ou treinamentos. Diz que não são todas as empresas que exigem um currículo extenso, pois querem apenas um profissional que trabalhe e dirija corretamente. O único curso que realizou foi o MOOP, em 2005, porém, terá de fazer reciclagem em breve. "Com tantas mudanças, hoje em dia é importante estar sempre de olho nas novidades e procurar se profissionalizar, se um dia a empresa para a qual trabalho exigir ou até mesmo oferecer algum tipo de treinamento vou ser o primeiro a querer participar", declara.
Outro novato na profissão, Anderson Lopes Rola, 23 anos de idade e um de profissão, viaja do Sul para o Nordeste e conta que foi difícil conseguir a primeira oportunidade, justamente por não ter experiência e especialização alguma na área. Lembra que tudo que aprendeu foi com seu pai e com o sogro. Confessa nunca ter se preocupado em fazer cursos, mas admite que está arrependido, pois hoje se tornou essencial ter um bom currículo. "Achava que não havia necessidade, mas o mercado me mostrou que não". Mesmo assim, acredita que o importante mesmo é a prática e dirigir com consciência.
Anderson reclama da falta de tempo, fator que impede os carreteiros de participarem de cursos. Na ocasião que foi entrevistado explicou que estava há 21 dias longe de casa. "A vida do motorista não é fácil, o tempo livre entre uma carga e outra é curto. No meu caso vou procurar me especializar um pouco em fevereiro, que será um mês tranquilo para mim", disse. Enquanto fevereiro não chega, Anderson se mantém atualizado através de matérias publicadas em revistas e programas na TV que mostram novas tecnologias para o setor de transporte rodoviário de cargas e o que acontece na estrada. "Sou novo e preciso estar atento às novidades para me manter competitivo. Quero correr atrás, principalmente do MOOP para ter mais opções de frete", finaliza.
Vander Rios, 33 anos de idade, atua no transporte internacional e também está há pouco tempo na profissão. Ele acredita que o seu diferencial para conseguir uma vaga na empresa foi o currículo profissional, o qual inclui cursos de Direção Segura e Defensiva, Movimentação de Cargas Perigosas, Pneus, Atendimento ao cliente e outros. "Alguns cursos fiz por conta, outros a empresa de ônibus que trabalhava disponibilizou. Sempre achei importante me manter atualizado e preparado, pois acredito que o leque de fretes é ampliado", destaca. Mesmo com pouco tempo na estrada, tem opinião de que realmente faltam profissionais qualificados, e o pior é que existem motoristas que ainda não entenderam a importância de estarem prontos para o mercado cada vez mais exigente.
"No meu plano para o futuro inclui fazer um curso sobre tecnologia e outros que forem surgindo conforme a necessidade do meu trabalho", diz. Apesar do segmento de ônibus exigir motoristas com treinamento adequado, Vander ressalta que o cuidado dos carreteiros deveria ser o mesmo, afinal, quando o caminhão é usado de maneira incorreta se torna uma arma. "Motorista preparado e consciente contribui para reduzir os acidentes. Já participei de palestras que me fizeram ter certeza da importância de dirigir com atenção. Alguns colegas dizem que sou certinho demais, mas pelo menos meu filho sempre vai ter de volta um pai vivo e saudável para brincar", afirma.
Esdra Canedo da Silva, 54 anos e 22 de profissão, faz parte da geração de motoristas que precisava apenas saber dirigir e se virar na estrada. Mesmo assim não ficou parado no tempo, pois tem consciência da importância de estar atualizado e acompanhar todas as mudanças no setor. Pensa que muitas coisas decididas apenas na teoria não funcionam na prática quando levadas para a estrada. "Sei que participar de cursos, palestras e treinamento é importante para se manter ativo no mercado, mas ninguém pensa que o motorista só ganha quando está rodando, estamos de mãos atadas", reclama.
Apesar da empresa para a qual ele trabalha nunca ter exigido nenhum tipo de especialização, Esdra conta que sempre que é oferecido um curso ou palestra, participa com muita satisfação, pois acredita que nunca é tarde para conhecer coisas novas e aprender. "A gente aprende durante toda a vida, se ainda não me especializei de maneira correta é porque não tive tempo", explica, reforçando a necessidade de estar preparado para lidar com as novas tecnologias incorporadas aos caminhões.
Os chilenos Luis Galleguillos, 47 anos de idade, e Cláudio Elgueda, 45, transportam frutas para o Ceagesp, em São Paulo, e retornam para o Chile com cargas diversas. Explicam que em seu país o currículo profissional é um dos critérios para contratação e também para se manter no emprego. No caso deles, a empresa para a qual trabalham exige que os motoristas passem anualmente por cursos de reciclagem, para se manterem sempre atualizados. "Os cursos aos quais somos submetidos são finalizados com uma prova e caso o motorista não tenha bom desempenho é reprovado e a carteira fica suspensa até que ele repita o teste e obtenha melhor classificação", detalham. Lembram que até os autônomos passam por treinamento antes de carregar. Apesar da frota chilena ser menor que a do Brasil, acreditam que um motorista treinado ajuda a contribuir para um trânsito mais seguro e que talvez por esse motivo o número de acidentes no Chile seja menor.
FONTE: Revista O Carreteiro