Facchini

Exames toxicológicos: Polêmica continua

A partir de junho, entrará em vigor a Resolução 460, criada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que exigirá de motoristas de caminhões, ônibus e vans a apresentação de testes toxicológicos na renovação ou obtenção da carteira de habilitação nas categorias C, D e E. 
A Resolução do Contran tem como objetivo oferecer mais segurança no trânsito em relação ao transporte de cargas, que continua protagonizando números trágicos de acidentes nas vias e rodovias brasileiras. Para se ter ideia, estudos realizados pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) indicam que as principais ocorrências de acidente envolvendo veículos grandes acontecem no período da noite e com condutores suspeitos de terem feito uso de substâncias psicoativas.
Entretanto, desde que foi criada, a lei gerou polêmica. Para a farmacêutica Lolita Tsanaclis, diretora científica da CansfordLaboratories e diretora da Chromatox, há ainda muita desinformação no mercado sobre as nuances e implicações desses testes, inclusive, em relação à presença do álcool em amostras de cabelo. 
“Em primeiro lugar, cito a questão da acreditação, uma vez que a ISO 17025 é a norma internacional de análises forenses. Entretanto, foi uma surpresa ao saber que a Resolução demanda que o laboratório envolvido nessas análises seja restrito ao credenciamento pelo Colégio Americano de Patologistas (CAP), ou seja, por um país estrangeiro. A exigência da Resolução 460 solicitando que o laboratório seja acreditado é correta, mas  ignora totalmente que a acreditação de laboratórios no Brasil é feita pela Divisão de Acreditação de Laboratórios (Dicla), de acordo com os requisitos da norma ABNT NBR ISO/IEC 17025, o que leva a crer que ocorreu uma falta de consulta a autoridades profissionais da área na execução do documento”, analisa Lolita.
Para a farmacêutica, seria importante consultar especialistas em toxicologia para se discutir os itens da Resolução, como fez a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) para implantar o programa de álcool e drogas nas companhias aéreas, por exemplo.
Quanto aos méritos na utilização de amostras de cabelo, ela também acredita que faltou a participação de indivíduos profissionais com conhecimento comprovado no assunto durante a execução e aprovação de partes do documento. “Claro que a intenção da Resolução é a melhor possível em decorrência do grande número de pessoas que morre nas estradas brasileiras – a estatística mostra que no Brasil em 2012 ocorreram 60 mil fatalidades –, sendo o álcool e drogas fatores significantes nas causas desses acidentes. Assim, a primeira questão que coloco é: qual seria o objetivo da Resolução 460? Ela pretende identificar todos os motoristas profissionais que fazem uso de drogas, e, dessa forma, eliminá-los completamente da profissão? Ou pretende iniciar um processo harmonizado envolvendo vários segmentos profissionais, para, conjuntamente, atuar na redução dos acidentes nas estradas devido ao álcool e drogas?”, questiona.
Na visão da executiva, no Brasil, semelhante a outras nações do mundo, ações de prevenção e de tratamento devem ser implementadas para diminuir os números elevados de acidentes fatais nas estradas. 
“Concordo que a análise de drogas em amostras de cabelo possam fazer parte do processo de renovação da carteira de motoristas, porém, também acho que a análise de drogas e álcool em amostras de cabelo não deve ser utilizada isoladamente, mas em associação a um conjunto de avaliações clínicas e outros testes específicos aos casos relacionados, tanto ao uso do álcool quanto para drogas ilícitas e medicamentos.  Não existe uma fórmula mágica que possa abranger todas as situações, mas um conjunto de ferramentas”, observa. 
Para Lolita, a Resolução 460 é um exemplo, porém, na sua forma atual, apresenta múltiplos erros textuais e de conceituação para que a sua implementação seja viável. 
“Esse trabalho de aprimoramento da Resolução tem de ser aberto, público, envolvendo todos os especialistas relevantes relacionados às diferentes esferas de ação, para que evolua corretamente nos moldes dos trabalhos já em progresso em outras partes do mundo. Este grupo de trabalho deve ser caracterizado pelo profissionalismo e ética dos seus integrantes. Mesmo assim, não será fácil”, pontua. 
FONTE: Na Boléia 
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